domingo, 17 de maio de 2009

É sempre bom lembrá-la

"Eu escrevo sem esperança de que o que eu escrevo altere qualquer coisa... Não altera em nada porque no fundo a gente não está querendo alterar nada. A gente está querendo desabrochar de um modo ou de outro"
Clarice Lispector

sexta-feira, 8 de maio de 2009


Dentro do carro, em um canto qualquer da cidade de São Paulo, entre um farol e outro, ao som de 'Novos baianos' Zé Celso, Astolfo e eu conversávamos sobre nós.

Por Zé Celso

O teatro não pode ser um instrumento de educação popular, de transformação de mentalidades na base do bom-meninismo. A única possibilidade é exatamente pela deseducação, provocar o espectador, provocar sua inteligência recalcada, seu sentido de beleza atrofiado, seu sentido de ação protegido por mil e um esquemas teóricos abstratos e que somente o levam à inefcácia.

Por Astolfo

Chamam-me de louco, porque ainda tenho nariz rubro como pipoca doce. O circo acabou por isso louco. Mas, aqui, mostro uma mentira e escondo todas as verdades. Para sempre louco!

Por mim

Intelectualidade demais é pra quem não goza.

quinta-feira, 7 de maio de 2009

Enquanto vovó faz comida

"Para bom entendedor meia palavra basta". A gente sabe o que querem dizer estas frases feitas, mas eu não creio que um texto deveria se fazer entendível, talvez isso dependa do fim que ele tenha. Porém, eu não gosto desta condição, nem deste fim para que ele sobreviva. Pegue uma pintura, o que nela não for figurativo não é compreendido? Talvez não mesmo, mas ali debruçada está a alma de um ser, as angustias, alegrias ou desejos de alguém... Para mim, uma obra tem de ser sentida, antes de qualquer teoria sobre qual movimento ou estilo artístico ela pertence. As manifestações criativas sobrevivem sem legenda. Um texto sobreviverá sem uma linha narrativa ou cronológica, sem uma história de começo, meio e fim. Me divirto com estes julgamentos e concepções e deles extraio mais um estímulo para criar sem condição alguma pré-estabelecida, e torno a dizer estou em busca do meio apenas. Um texto meu poderá ser um meio para qualquer coisa. Sinta.

Anseios subtraídos ou *An Seios


"E ninguém é eu. Ninguém é você. Esta é a solidão"
Clarice Lispector

Da terra
Tiro um amor despreparado.
Das máscaras
Arranco a meia luz de uma noite covarde.
Tomo banho apenas para sagrar-me limpa
Esquecendo-me de que suja andei por ai
Desamparada
Embriagada, talvez
Desesperada.
Dos sonhos
Peço uma clara manhã preguiçosa,
Com véus e promessas inacabadas
Exacerbadas
Malditas
Esquecidas.
Do ar busco apenas inspiração
Como cura dos prazeres outrora perdidos.
Agonia não tem face, pois
Porém sinto suas mãos frias
Nos meus seios
Sussurrantes
Que abrigam um céu inóspito
Insólito.
Sem querer a tenho aqui comigo
Sem ombros, nem colo
Num breu fétido e atrevido
De um caminho vívido
Fértil
E líquido
Que escorre
E eu deixo escorrer.


* An ou Anu era o deus do céu entre os Sumérios. Filho de Anshar e Ki-shar, esposo de Antu (Ninhurdag) com que gerou Enlil, era o deus mais venerável e velho entre os Anunnaki, fazendo parte de uma importante tríade divina, integrada também por Enlil, o deus dos ventos, e Enki (Ea), o deus das águas.O seu nome parece significar precisamente céu, ou alternativamente, o zénite do Sol. Era um deus cultuado em toda a Suméria, havendo santuários seus espalhados por todas as cidades do país.

segunda-feira, 4 de maio de 2009

Um rabisco desenhado




Parte de um diálogo de devagações a respeito de "Os Sertões", texto de Euclides da Cunha adaptado por José Celso Martinez Corrêa

Concordo em partes cara companheira. Tomando por base a mais pop e não menos verdadeira frase do ilustre e filósofo Sartre "O inferno são os outros", a festa dionisíaca que embala os atuantes há 30 anos nada mais é do que peles tocantes. Apenas e nuas.
Se o nu lhe parece pornográfico, não será Zé Celso um ousado quebrador de barreiras e sim você uma construidora de definições e bloqueios. E já que o mais profundo é a pele - dito pelo filósofo e tão francês quanto o primeiro Paul Valéry - o espetáculo alcança de forma magistral a razão de sua existência. Sem fronteiras evoca o ser humano a aprofundar-se. Sem roupas demonstra aos menos tocados suas falsas liberdades, quando o aprisionamento parte de quem vê, e não de quem se propõe a fazer. Não há nada de inovador nisso. Eu apenas diria assista. Augusto dos Anjos ficaria feliz, na literatura ele é cru e nu é Zé Celso no teatro. Afinal o sertão é nu e cru, não?